Opinião | O telhado de vidro do bolsonarismo: BRICS, memória curta e conveniências ideológicas

Por muito tempo, o grupo BRICS — formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — foi tratado com entusiasmo por governos brasileiros de diferentes espectros políticos. Não foi diferente no governo de Jair Bolsonaro. Em 2019, durante a 11ª Cúpula do BRICS em Brasília, o então presidente exaltou o bloco como um exemplo de cooperação bem-sucedida e reafirmou publicamente o apoio do Brasil ao Novo Banco de Desenvolvimento, à integração econômica e ao sistema multilateral de comércio.

Na ocasião, Bolsonaro declarou:

“Menciono, como exemplo bem-sucedido da cooperação no BRICS, o Novo Banco de Desenvolvimento. Aproximá-lo do setor privado e garantir que atenda às necessidades de financiamento em infraestrutura é prioridade para nosso governo.”

Também destacou que o BRICS era fundamental para a estabilidade e prosperidade da economia global, especialmente após a crise de 2008. Ou seja, não apenas apoiou o BRICS — como fez isso com entusiasmo e pragmatismo, reconhecendo a importância do bloco no cenário internacional.

Por isso, causa estranheza e até certo desconforto ver bolsonaristas nas redes sociais hoje demonizarem o BRICS e seus integrantes, chamando seus líderes de “ditadores” e o grupo de “ameaça comunista”. O mesmo Bolsonaro que estendeu a mão para Vladimir Putin e apertou com orgulho a de Xi Jinping agora é tido por muitos de seus seguidores como um guerreiro contra o que o próprio já endossou.

É claro que os contextos mudam, que governos ajustam discursos e que relações internacionais são complexas. Mas a memória não deve ser seletiva — e muito menos manipulada. A internet está aí para lembrar: quem hoje vocifera contra o BRICS, ontem o exaltava. Quem hoje atira pedras no “sistema”, já foi parte ativa dele.

O problema não é mudar de opinião. O problema é fingir que nunca se teve uma, ou pior, tentar reescrever o passado conforme a conveniência ideológica do presente. A política exige coerência, mesmo diante das contradições do mundo. E se há algo que o Brasil precisa menos neste momento é de revisionismo ideológico barato, embalado em discursos inflamados e descolados da realidade.

Antes de acusar os outros de alianças espúrias, seria bom lembrar que o próprio bolsonarismo já compartilhou a mesa — e os aplausos — com aqueles que hoje rotula como inimigos. E como diz o velho ditado: quem tem telhado de vidro, deveria pensar duas vezes antes de jogar pedras.

Fonte: Agência Brasil

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