Por 8 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão histórica nesta quinta-feira (26) que muda profundamente a forma como plataformas digitais operam no Brasil. A Corte considerou inconstitucional o Artigo 19 do Marco Civil da Internet, abrindo caminho para que empresas como Meta, Google, X (ex-Twitter) e outras sejam responsabilizadas civilmente por postagens ilegais feitas por seus usuários, mesmo sem ordem judicial prévia.
A mudança representa um duro golpe no modelo de autorregulação que as plataformas vinham defendendo há anos — e uma vitória para vítimas de crimes virtuais, como discurso de ódio, fake news, injúria racial, misoginia, homofobia e outros abusos cometidos online.
O que mudou na prática?
Até agora, as plataformas só podiam ser responsabilizadas judicialmente por conteúdo ilegal caso ignorassem uma ordem formal da Justiça para remover o material. Com a decisão do STF, essa proteção foi derrubada. Agora, basta que a empresa seja notificada — por exemplo, por uma vítima ou seu advogado — e não tome providências adequadas, para que ela possa ser processada por danos morais, materiais ou outros prejuízos causados.
Ou seja, o dever de agir das plataformas foi antecipado: não é mais preciso esperar a caneta de um juiz para que a empresa passe a ter responsabilidade.
Voto da maioria
A maioria dos ministros argumentou que o Artigo 19 do Marco Civil da Internet violava preceitos constitucionais como o acesso à justiça, a proteção da dignidade humana e os direitos fundamentais à honra e à imagem. O relator do caso, ministro Dias Toffoli, destacou que o modelo antigo criava um escudo quase intransponível para as big techs.
“É inconcebível que, diante de uma notificação clara e fundamentada de uma vítima, a plataforma cruze os braços esperando que o Judiciário resolva, quando ela própria tem meios técnicos para agir”, afirmou Toffoli.
Reações divididas
A decisão provocou reações imediatas e contrastantes. Entidades de defesa dos direitos humanos e vítimas de crimes digitais comemoraram a decisão como um avanço civilizatório. Para elas, a mudança corrige uma lacuna que vinha facilitando a impunidade no ambiente digital.
Por outro lado, representantes das plataformas e defensores da liberdade de expressão alertaram para riscos de censura privada e remoções excessivas. Segundo esse grupo, a nova regra pode incentivar a retirada de conteúdos legítimos por medo de processos judiciais.
Impacto direto para o usuário
Se você usa redes sociais, senta que lá vem mudança. A partir de agora:
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Notificações de usuários ganharão mais peso.
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As plataformas terão de reagir com mais agilidade e critério.
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O risco de que conteúdos sejam apagados sem análise judicial aumentará.
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A responsabilização pode influenciar os termos de uso, algoritmos e até a moderação automatizada.
O começo de uma nova era digital no Brasil?
A decisão do STF marca o início de uma nova fase no debate sobre liberdade de expressão, responsabilidade digital e regulação das big techs no país. O Congresso Nacional já discute o Projeto de Lei das Fake News (PL 2630/2020), que agora pode ganhar tração com o respaldo do Judiciário.
Uma coisa é certa: o tempo da terra sem lei na internet está com os dias contados. E, para o bem ou para o mal, o Brasil acaba de entrar em um novo capítulo da era digital — com menos anonimato, mais deveres e, quem sabe, mais justiça no universo online.